quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

#64 - CANTIGAS PARA OS TRABALHADORES DOS CAMPOS, Bernardo de Passos

Sou cavador, cavo a terra
Donde nasce a flor e o grão.
Dou aos outros a fartura
E em casa não tenho pão.

Hoje planto árvor's e vinha,
Lavro a terra, rego a horta,
E amanhã, em sendo velho,
Pedirei de porta em porta.

O sol a todos aquece,
Não nega a luz a ninguém,
Ama os bons e ama os maus
E assim foi Jesus também.

A árvore, quanto mais fruto,
Mais baixa os ramos p'ra o chão.
O homem, quanto mais rico,
Mais ergue a sua ambição.

A vida do pobre é isto:
-- Trabalhar enquanto moço,
E em velho andar às esmolas
Como o cão que busca um osso.

Morre um rico, dobram sinos!
Morre um pobre, não há dobres!
Que Deus é esse dos padres
Que não faz caso dos pobres?

Se pão não tenho, e os meus filhos
Me pedem pão a chorar,
Dou-lhes beijos, coitadinhos!
Que mais não lhes posso dar...

Sinto no mundo um rumor
Que anuncia um dia novo,
Andam profetas na terra
Abrindo os braços ao povo!

O sol nasceu cor de sangue
E a lua da mesma cor.
Gritam as bocas: Mais pão!
E os corações: Mais amor!

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